quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Papo de mães


- Você já comprou o novo livro educativo da capa rosa?
- Ainda não
- Imperdível. Li três vezes para a Ana e ela já soletra palavras oxítonas
- Com dois anos?
- Incrível, né?
- E vocês acreditam que ontem a babá do Antônio preparou macarrãozinho para o jantar? Isso mesmo: m-a-c-a-r-r-ã-o!
- Hã...
- Pois é, quantas vezes preciso explicar que desde os quatro meses ele come toda santa refeição alimentos orgânicos diversificados de acordo com a pirâmide nutricional?
- Essencial
- Gurias, ontem a professora da Bárbara me chamou de canto para contar que ela é a única da classe que desenha figuras humanas com perfeição
- Uau!
- E querem saber o mais incrível? As figuras estão sempre sorrindo. Tudo por causa da infância feliz que proporciono a ela
- E vocês viram o demi-plié perfeito que a Maria Eduarda tem feito no balé? Dom nato. Já rodopiava desde o útero, sempre soube que teria expressão corporal
- Ela é mesmo espetacular
- Não, e para tudo: Carlos chegou ontem em casa e disse "mamá, ti amu more than everything in the hole world". Poliglota. Fiquei babando
- Ai, que máximo, você deve estar super orgulhosa.
- Super
- Ei, o que será que nossos homens tanto conversam naquela mesa, hein?
- Futebol, óbvio!
- Ai homens, sempre competindo!



segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Bolo cor-de-rosa

Tem semanas em que a gente tem vontade de se afogar numa garrafa de Merlot ao meio dia.
Mas minha realidade materna torna tais planos etílicos ou mesmo um banho de banheira com sais, sonhos de consumo a longo prazo. Assim, nestes últimos dias, não tive opção a não ser o mau-humor, o stress e a costumaz ansiedade.
No automático, trabalhei, cozinhei, arrumei e cuidei. Respondi e-mails, troquei fraldas, lavei e passei (mentira, sou um zero à esquerda na lavanderia).
E enquanto estava imersa em meus planos de insurreição, que raramente saem da revolta quase épica dos meus dedos no teclado, minha filha sugeriu: "mãe, vamos fazer um bolo cor-de-rosa?"
Um bolo. E cor-de-rosa! Eu, sem paciência sequer para um brigadeiro de microondas e ela querendo que eu tingisse claras em neve. Eu, a la Nelson Rodrigues, ela a la Princesa Fairy e as Fadas. Eu, sem tempo, ela de férias. Eu, dando coice, ela... e seu olhar doce.
Convencida, separamos os ovos, peneiramos a farinha e convidamos a vizinha. E ela sorriu e misturou, sorriu e peneirou, sorriu e me encantou: "mãe, eu adoro cozinhar com você".
Obrigada maternidade, que torna sonhos etílicos planos a longo prazo, mas me brinda com pedidos de amor a uma vida cor-de-rosa.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Escolhas

Mães.
Algumas trabalham fora, estudam e equilibram funções
Outras dedicam-se integral e ininterruptamente à maternidade
As primeiras, precisam de um incrível jogo de cintura para dar conta de atender a expectativas diversas
As segundas, acompanham cada etapa de todos segundos das vidas de seus pequenos sapecas
As primeiras, recebem elogios, aplausos, promoções e salários
As segundas, apesar de amorosos abraços, não são aplaudidas, elogiadas e tem a conta do banco zerada
As primeiras, estão sempre um tantinho culpadas
As segundas, um tantinho acabadas
As primeiras, usam salto, mas desejam uma segunda-feira inteira brincar descalço
As segundas, raramente vistas sem moletom, desejam mais motivos para usar maquiagens impecáveis em tom sobre tom.
E as duas são mães
Amam
Educam
Vibram
Incentivam
Contam histórias
Beijam machucados
Agasalham em noites frescas
Acolhem após pesadelos
Choram a dor deles
E fazem escolhas
Que por opção ou necessidade, não podem feitas sem que outras sejam sacrificadas
E essa verdade só torna-se absoluta após a maternidade


domingo, 15 de dezembro de 2013

Home Office

Ligo o computador 
Preparo a mamadeira
Respondo um e-mail
Ligo a televisão
Acesso uma fatura
Tá, eu coloco o DVD do Pocoyo
Entro no site do banco
Um de cada vez, agora é O Rei Leão
Quem quer gelatina? 
Respondo três e-mails
Não deixem cair gelatina no sofá! 
Onde parei mesmo? 
Ah, no terceiro e-mail
Daqui a pouco te pego no colo
Prezado cliente,
Não precisa chorar
Agradecemos seu contato
Tá, vem no colo
Pfhsdjfhj
Não mexe no teclado do computador da mamãe
Digito um pedido
Ok, pega essa caneta que eu pego outra
Envio o pedido
Gente, preciso de dez minutos para responder e-mails
Alô
Filho, cadê você? 
Alô? 
Filha, cuidado para não cair
Atenciosamente, 
Nurit
Mamãe.

Senhora perfeitinha

Olhar milimetricamente calculado e sorriso inerte

Assim é a senhora perfeitinha
Com suas diversas qualidades,
Mas que não dentre elas a naturalidade

Com seu marido, diz ela, vive num eterno flerte
Traça objetivos sem risco de que não os acerte
Seus filhos, perfeitos, jamais agem como crianças
Mostra ao mundo que sua perfeição é leve como uma dança

E este mundo fingiria acreditar
Talvez simplesmente por preguiça de se importar
Não fosse a senhora perfeitinha
Ávida critica das senhoras normais

Senhoras normais que perdem a paciência
Às vezes a decência
Brigam em público
Aceitam as falhas com naturalidade
E pasmem...
São felizes de verdade

Só não aceitam críticas
Nem julgamentos
Porque se em briga de marido e mulher
Ninguém mete a colher
Imagina em educação de filho
Aquele que tem nos olhos delas seu mais intenso brilho

Então, o recado é esse:
Senhora perfeitinha,
Boa sorte com seu olhar milimetricamente calculado
E com seu sorriso inerte e talvez covarde
Mas da educação dos meus filhos cuido eu
Que me importo com eles de verdade



Ene de Nurit

Ene u erre i tê. Tê de Teresa. Se eu fosse Teresa, não teria que soletrar meu nome cinco vezes ao dia. Mas se não fosse Nurit, jamais teria escutado "claro que lembro de você, com esse nome..."

Nascimento? Foi em 1980. O primeiro. Depois nasci como mulher, como independente, como assalariada, como não assalariada, nasci como esposa e nasci como mãe. Duas vezes.
Sou formada em publicidade, mas nunca publicitei. Queria ter feito aromaterapia, mas a gargalhada de meu pai não soou promissora. Tenho MBA em marketing, aquela profissão que tem utilidade para qualquer coisa que se faça na vida. Mas evito falar que sou marketeira. Soa perjorativo.
Trabalho como vendedora por opção. Opção de ser dona do meu tempo.
Tenho mestrado em assuntos do lar. É serio. Não é para qualquer um, não. Não sei pregar botão, nem passar camisa, mas em casa não falta cheirinho de bolo e spray de lavanda para perfumar a vida. Ao final do dia, melhor voltar para o lar do que para uma lavanderia: algumas coisas a gente terceiriza, outras não. Agora, livre docência é na maternidade. Paixão mesmo. Minha formatura está prevista para 2070. Acredita que tem matéria nova todo dia? E tudo cai na prova.
Um dia irei escrever. A árvore eu já plantei.
Cursos de inglês, espanhol e hebraico. De Freud, risoto e mikve.
Alérgica a Sulfa, à necessidade de aprovação, a ser sempre certinha. Mesmo minha maior rebeldia tendo sido largar um estágio numa multinacional para fazer produção executiva de uma peça de teatro de nome impublicável em horário comercial. Atualmente, minha única transgressão é comer carne de porco. Mas por isso tenho sempre bacon no congelador. Sabe como é: em caso de emergência.
Endereço. Me escondo à noite. Durante o dia gosto de ver gente, escutar conversas. De preferência em ambientes abertos e com uma xícara de café. Sem chantilly. Manteiga batida é quase tão sem graça quanto salsinha.
Não quer saber meu signo? Leão. Com ascendente em escorpião. Caso contrário, isso seria apenas uma ficha padrão. Com seis linhas de pura monotonia.

Assinado,
Nurit. Ene u erre i tê. De Teresa.

1 + 1 = 11


Sabe aquele papo de "é só por mais água no feijão"? Pois é, pura mentira, além de aguar a comida.
Ter dois filhos é uma loucura total. Duas crianças criam demandas completamente diferentes aqui em casa.
Uma come, o outro mama. Uma toma banho num horário, o outro noutro. Uma quer brincar de boneca, o outro de chocalho. Uma quer ficar em casa, o outro dormir andando de carrinho. Uma chora, o outro chora. Um dorme, o outro acorda. Ainda não estão numa idade em que possam brincar juntos e me dar alguns momentinhos de paz e tranquilidade.
Fora que um a gente delega, dois a gente divide (e nunca descansa).
A esta conclusão cheguei ontem, quando fazia supermercado com os dois. Pequeno dois na cadeirinha do carrinho e pequena um no meu colo (com vergonha do 'moço'), eu cantando a recém-inventada "dança do suco" enquanto tentava escolher o sabor do dito cujo na gôndola e checar sua validade.
Minha vida está um caos. Como a família toda mora longe e não tenho o desprendimento (ou capacidade) de ter uma babá e deixar que um estranho tome conta dos meus filhos sem criar uma colônia de minhocas na minha cabeça, preciso montar uma logística de guerra até para atividades simples como fazer depilação.
E a maior loucura disso tudo é que, apesar de estar exausta, sonhando com uma noite inteira de sono, me pego desejando que o tempo pare.
Meus pequenos dão trabalho de onze, mas prazer de cem.

Nurit Bond



Após uma longa temporada em São Paulo, lá fui eu reempacotar a casa. Sim, viajar com criança requer praticamente uma transportadora, mas enquanto a Granero inviabilizar a viagem, eu mesma faço o trabalho. Dois volumes explodindo e uma atendente de check-in queridíssima (que não cobrou excesso de bagagem) depois, entro no avião, rumo aos pampas e ao marido, de quem já morria de saudades.
Pequena fofésima no avião, sem piscar os olhos e - ufa - chegamos. Marido pega a Taly enquanto eu, as malas. Roda a esteira, roda, roda, roda e nada do segundo volume chegar. Um olhar mais atento avistou uma bagagem bastante similar, mas que parecia estranhamente... leve. Abro e encontro fraldas, biquinis e roupas sujas. Socorro. Não era a minha.
Corro para a fila de taxi, pois pela fralda, já sabia que era da mulher que também estava com um bebê durante o vôo. Descrevo-a para o taxista que diz:
- Ih dona, ela acabou de sair
- Qual era o número do taxi?
- 2898
- Então vamos ligar par o taxista!
Caixa postal. A esta altura, já havia percebido que Murphy aparecera para uma visita.
De volta ao balcão da Gol, tantamos contatar a madame distraída. Adivinhe: caixa postal. Bom, então abre-se a mala da dita cuja, a procura de algum documento que contenha outro telefone.
Neste momento, já via meus carregadores, documentos de trabalho, sapatinhos da pequena, brinquedos novos, minha bota linda-de-morrer, pó compacto novo da MAC, enfim, tudo o que era MEU, habitando um passado remoto. Até que -ops - um telefone diferente. E de Mato Grosso do Sul, a filial brasileira dos pampas.
Toca, toca e atende um homem, marido de Daniela - a madame distraída - que avisa: "Xi, ela foi para a rodoviária e pegará um ônibus às 18:00h para Serafina Correa".
Ooooi?? Ela vai viajar, não percebeu que a mala está trocada e ainda não teve a capacidade de ligar o celular?
Nisso, Taly chora de sono e marido diz:
- Amor, são 17:30h. Vamos correr para a rodoviária tentar encontrá-la
- Mas está chovendo e é horário de pico
- Estamos em Porto Alegre, quem sabe?!
- Ai, que saudades da minha mala. Ok, vamos.
Numa operação 007, corre-se com as malas, elevador, Taly na cadeirinha, bagagem no porta-malas e rumo à rodoviária. Em alguns momentos, gosto muito de morar por aqui e este foi um deles: às 17:55h estávamos na rodoviária. Corro pelos boxes, de salto alto, me sentindo a própria Nurit Bond, mas p-u-t-a- da vida. Bento Gonçalves, Passo Fundo, Caxias do Sul... SERAFINA CORREA! E madame distraída.
Pausa para respirar
- Você está com a minha mala!
- (cara de espanto) Acabei de perceber que não era minha (tóim). Mas como você conseguiu me achar?
- Ah minha querida, quando se trata de mulheres, botas e maquiagem nova, não se brinca!

Ok. não foi bem esta a resposta, mas para dar mais graça a um final de tarde que acabou com mau-humor e chapinha destruida pela chuva, vale a licença poética, vai?

Dúvidas de mãe

Lembra da mulher relativamente focada que costumava habitar seu corpo antes da maternidade? Pois é, foi embora levando sua cabeça livre de preocupações, seu sono em dia, sua classe e etiqueta. E sobra você, infinitamente mais feliz, mas com a cabeça cheia de dilemas:


- Encho a casa de câmeras e fico paranóica ou somente fico paranóica?
- Episódio inédito de Desperate Housewifes ou preencher o 'Livro do bebê'?
- Baby Einstein ou Backyardigans?
- Baby-sitter e balada ou baby-sitter e mais horas de sono?
- Salto básico e baixo ou salto alto e Dorflex?
- Estée Lauder ou Johnsons?
- Dar bronca ou dar risada?
- Almoço longo, com conversas e cheio de saudades ou almoço voando, com cadeirão, bagunça e gritos?
- Compras para mim e para ela ou para ela e para ela?
- Massagem e manicure ou aula de música infantil?
- Tentar assumir a 'super nanny' em público ou voltar para casa correndo?
- Pássaro e cachorro ou piu-piu e au-au?
- Domingo na cozinha ou papinha da Nestlé?
- Curtir a retomada de posse do seu peito ou ter mais um filho?
- Mimar demais e culpar a genética de ídiche mame ou mimar demais e pagar terapia mais tarde?

Duas estórias

Era uma vez uma criança graciosa e meiga, que tinha uma mãe que a amava demais. Quando ela estava com sete meses, a mãe precisava voltar a trabalhar e resolveu colocar a filhota num berçário escolhido a dedo, após uma longa seleção. No primeiro dia a criança ficou muito bem. No segundo, tranquilíssima e no terceiro, jogou-se no colo da professora logo na entrada. A mãe ficou muito segura, vendo que sua cria estava em ótimas mãos e feliz, e seguiu sua rotina em paz.


Era uma vez uma criança graciosa e meiga, que tinha uma mãe que a amava demais. Quando ela estava com sete meses, a mãe precisava voltar a trabalhar e resolveu colocar a filhota num berçário escolhido a dedo, após uma longa seleção. No primeiro dia, a criança ficou muito bem. No segundo, tranquilíssima e no terceiro, jogou-se no colo da professora logo na entrada. A mãe não acreditava. Tinha certeza de que sua filha seria daquelas que esperneariam como a suplicar "mamãe, mamãe, volte, não vivo sem você". Mas não, lá estava ela divertindo-se apesar de sua ausência. No carro, ao tentar retomar sua rotina sem ignorar a saudade que esmagava seu coração, sentiu as lágrimas inundarem seu rosto ao pensar em sua filha viajando sozinha, saindo de casa, sendo independente. Aquilo levaria muitos anos, mas o cordão umbilical, gostasse ela ou não, já fora cortado.


Fim. Ou não.

Num café escritório qualquer


Faz oito anos que abri mão de trabalhar trancada em uma sala. Uma série de motivos me levaram a tomar essa decisão e, apesar da segurança do dinheiro na conta todo dia cinco, minha qualidade de vida mudou completamente.
Não sei por que raios, janelas amplas e arejadas nunca foram pontos fortes das empresas por onde passei e, talvez por isso, valorize tanto passar o dia ao ar livre. Além de ver o dia de cabo a rabo, de sentir o sol, o vento e - fazer o que - a chuva, adoro meus cafés-escritório, lugares que escolhi para trabalhar, pagando o aluguel em espressos e pães de queijo.
E de tudo, o que mais me fascina, é ter colegas de trabalho novos todos os dias. Gente que senta ao lado para trabalhar, conversar, almoçar ou discutir a relação. Não nego: às vezes finjo estar concentrada numa planilha, somente para lançar minha atenção ao lado. Já escutei senhoras falando de sexo, fazendeiros sobre cifras, noivas planejando casamentos nada modestos e até uma pastora reclamando do pai castrador (na realidade, este último passa-se no exato instante em que escrevo este post).
Talvez seja indiscrição, mas as pessoas falam alto mesmo, às vezes embaladas por jarras de clericot às três da tarde. Mas sabe o que? Ver a diversidade me inspira. Não que eu não julgue, sou humana. E mulher. Mas às vezes, em horário comercial, ficamos tão centrados no nosso mundinho, falando somente sobre os mesmos assuntos e conversando com as mesmas pessoas, que um sopro de vidadooutro deixa o dia mais leve.
Então, antes de voltar aos e-mails, vou escutar como termina a história da pastora e pedir mais um espresso. Ou quem sabe, um clericot.

Ensaio sobre a rotina


Amélia era moça direita, assim bem bela
Prestimosa, fazia as tarefas e até bolo de canela
Elegante, estudiosa e polida era ela
Moça direita, prometida a Paulo Nozella
Este sim, o sonho de qualquer donzela
Sua mãe sentia grande orgulho dela, sua bela Amélia

Até que Amélia, esta bela e jovem donzela
Curiosa sobre a vida ao redor dela
Cansada de cerzir flanela
E de rimas banais sobre ela
Resolveu fugir de casa

Na primeira esquina, conheceu Carlão
Jovem assim, sem classe e sem rima
Barba mal feita e bafo de cerveja
Homem sem estudo, homem do mundo
E ela se apaixonou

Esta vida de desregrada aventura
Cheia de gente impulsiva e sem ternura
Encantou a jovem Amélia
Que conheceu da maconha à pamonha
Do pompoarismo ao populismo
Da balada GLS às moças sem catequese

Até que um dia, Amélia acordou vazia
Carlão dormia ao lado, chapado de ácido
E a novidade já não a divertia
Ela tinha saudade da vida que tinha
Concluiu que rima por rima, ficava com a rima antiga
E que licença poética repetida é pleonasmo na poesia

E assim Amélia voltou pra casa dela
Casou com o Nozella e usou lingerie amarela
Fazia pudim de Nutella e bolo de moela
E se não viveu feliz para sempre, viveu feliz com a vida dela.

Vinte e quatro horas

O dia começa, eu de pijama, despenteada, trocando fralda. Dou de mamar. Coloco minha filhotinha para dormir. Ela dorme. Acorda. Tiro do berço, nino. Ela dorme. Coloco no berço, acorda. Passa uma hora e ela dorme definitivamente. Eu volto para a cama, dormindo o sono leve que só que já teve uma babá eletrônica no lugar do desperador entende. Dali a algumas horas a história se repete. Depois eu me troco, penteio, passo um rimel para mostrar ao marido "cheiro leite, mas sou vaidosa". Vou trabalhar no computador (nada de licença maternidade). No meio do e-mail, choro na babá. Subo e faço carinho na cabeça. Não é hora de mamar. Ela dorme. Acorda. Dorme. Acorda. Desisto. Levo pro carrinho e aproveito para almoçar, com uma das pernas fazendo o vai-e-vem do carrinho. Ela dorme. Acorda. Hora de mamar. Troco a fralda, dou de mamar. Faço arrotar. Coloco no berço. Dorme. Acorda. Dorme. Acorda. E assim vamos até o final do dia. Marido chega. Banho. Mamar. Dorme. Jantamos. Acorda (sim, no meio do jantar). Dorme. Acorda. Dorme. Ufa. Boa noite.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Malu Mulher


A mão eu não faço a três meses (já estou duvidando se o cheiro de hipoglós nao será para sempre), mas sábado foi um dia chic.
Cabelos arrumados, roupa clara sem medo de manchar de regurgito e sem botões na frente para poder amamentar. Bolsa pequena, onde não precisava caber a girafa de pelúcia e lá me fui com marido a passear enquanto mãe-que-é-mãe cuidava da pequena.

Do alto do meu salto, que não usava a uns dez meses e do qual quase cai umas três vezes, fui ao programão sushi mais supermercado.
Entre as gôndolas eu me achava, assim como quando casei, estilo "sou uma mulher independente". Na época de recém-casada era por pagar a fatura mas agora, por usar calça justa, sapatos lindos e bolsinha pequena, passeando entre as gôndolas dona do meu tempo. Tipo assim, meio ridícula mesmo.

A materidade faz cada coisa com a gente. Mas imagine você, uma semana após dar a luz, descabelada às quatro da tarde, com a barriga que não voltou ao lugar e não contém mais um bebê, curvada pelos pontos da cesárea, com um rímel e tentando sorrir para as visitas e uma querida chega e diz: "nossa, que cara de acabada". Daí vem sua irmã caçula com a pérola "bem que dizem que a mulher fica largada de pois de ter filhos".
Pior, imagine você, sentada num café, três meses depois, já se achando ótima, magra e sem olheiras e outra querida que não te vê faz tempo comenta "a maternidade acaba mesmo com a gente, né?".

Deu para entender o momento saltitante entre embalagens de vinagre e latas de sardinha de maquiagem, calça justa, sapatos lindos e bolsinha pequena?

Recém



Recém-casada. Todo mundo comentando como este início é delicioso, cheio de paixão, plenitude e alegria e você lá, pensando que raios está fazendo com um homem vinteequatro horas ao seu lado, num apartamento que, apesar de arrumadinho, não é seu lar de jeito nenhum.
Porque convenhamos, é uma delícia não ter que dar beijo de tchau ao final do domingo ou planejar todo fim de semana onde vocês passarão a noite. Mas segunda-feira costumava ser um dia perfeito para chegar do trabalho, vestir as pantufas e jantar no quarto assistindo a um seriado do momento. Fazer o que desse na telha sem ter que se preocupar com mais ninguém. Mas agora você tem. E além de dividir seu tempo de dolce far niente, vocês dividem assuntos romanticíssimos como "quem vai pagar a conta de luz", "quem vai na reunião de condomínio" ou "pede pra faxineira passar melhor a minha camisa".
E daí? Daí você sobrevive ao primeiro ano e entra no segundo. Agora sim, cheio paixão, plenitude, alegria e realidade.
Como seria bom se todas as expectativas e promessas fossem dosadas com conselhos verdadeiros. 
E então, quando tudo está nos eixos, vocês resolvem que é hora de aumentar a família.
E vem a gravidez, o parto, conhecer seu bebê... momentos plenos. Até você chegar em casa onde não tem nenhum botão para chamar enfermeira alguma.
É claro que existem mães com síndrome de Mary Poppins, que realizam-se acordando de duas em duas horas durante a madrugada. Eu quase enlouqueci. Eu e uma série de mães cheias de culpa por não estarem saltitando quando suas vidas viraram de cabeça para baixo, quando tomar um banho ininterrupto ou conseguir tirar o pijama antes das três da tarde tornam-se os pontos altos do seu dia. Claro que você ama aquele mini serzinho, mas este amor ficará absurdamente intenso, incondicional e espetacular após alguns meses. Mães sem síndrome de Mary Poppins estipulam três meses.
E nossa culpa por não estarmos plenas nos momentos "recém" só aumenta com a enxurrada de comentários derivados do "aproveite, esta é a melhor fase da sua vida".
Melhor fase é quando a gente acostuma-se com o novo. E com os novos que realmente importam nessa vida.
Mas acredite, quando você se acostumar, nada - NADA - te fará mais feliz.